Apropriação Cultural II: Indústria Cinematográfica
Whitewashing é o termo utilizado para indicar uma forma de apropriação cultural que acontece, principalmente, na indústria cinematográfica. Apropriação cultura se dá quando um grupo dominante utiliza e comercializa de forma irresponsável um objeto/característica de um grupo submisso.
Apesar da lista de filmes que passaram por um processo de whitewashing ser maior que 70, a discussão sobre o tema é relativamente recente, ganhando força através dos movimentos raciais de resistência que buscam maior representatividade.
O processo acontece quando um papel categoricamente racial não-branco é atribuído à um ator branco, apesar da diversidade de atores e atrizes das mais diversas etnias disponíveis para os papéis. Podemos ver exemplos disso em filmes como “Príncipe da Pérsia” (2010), “O Último Mestre do Ar” (2010) e “Bonequinha de Luxo” (1961), que apresentam o processo branqueador contra diferentes grupos.
O filme mais antigo avaliado com processo de whitewashing é “Charlie Chan Carries On” no ano de 1931, onde um ator branco interpreta um detetive chinês utilizando a técnica do yeallowface, que é o uso de maquiagem para adaptar a aparência à uma raça diferente da sua.
A indústria cinematográfica hollywoodiana é a principal criadora de casos de apropriação cultural. Com a maior base de produtores, diretores e investidores brancos, muitas vezes tal processo é criado com a premissa de que são necessários grandes atores, em sua maioria brancos, para que um filme faça sucesso nas bilheterias. O que acontece é um corte ou inibição de investimento financeiro em filmes que não adaptam seus filmes com atores brancos, confirmando formas institucionais de racismo que se acobertam em argumentos neoliberais econômicos.
O negro
Como pode ser notado em diferentes filmes, negros geralmente possuem papeis secundários e altamente restritos, sendo, em sua maioria, de empregadas domésticas, enfermeiras ou pessoas com personalidade-caricatura. Em seu discurso de vencedora do Emmy 2016, Viola Davis (How To Get Away With Murder, 2014) defendeu a representatividade do negro nos filmes ao descrever que só podem ganhar prêmios cinematográficos aqueles que tiverem a oportunidade.
Um episódio que mostra a força do processo de apropriação cultural como uma forma de desrespeito aconteceu de maneira inusitada. A peça “Harry Potter e a Criança Amaldiçoada” (J. K. Rowling, 2016) contou com uma personagem negra, previamente caracterizada branca nos filmes. Um grande número de pessoas repudiou a escolha da atriz, considerando mal adaptada à caracterização da personagem nos demais contextos. Nessa situação podemos notar o sentimento criado por um deslocamento racial que acontece com frequência elevadíssima contra raças não-brancas e que é descartado por não servir aos pertencentes às classes dominantes.
Ao expandir o olhar para indústrias relativas à cinematográfica, podemos encontrar o processo de whitewashing nas capas de livros e em produções televisivas como séries, novelas e comerciais. Quando não há o peso da raça sobre um personagem historicamente racial, na maioria dos casos são usados atores caucasianos.
No Brasil também vemos exemplos da dominância branca nas telas. A pesquisa da GEMAA apontou que, entre 1994 e 2014, somente 4% das protagonistas em novelas da rede Globo foram interpretadas por mulheres não-brancas, e que apenas três atrizes revezaram para interpretar tais papeis (Juliana Paes, Camila Pitanga e Taís Araújo). Ainda assim, os estereótipos raciais negros marcam a maioria dos papéis disponíveis aos atores e atrizes.
Angela Davis, norte-americana, disse em 2014 durante a conferência de Latinidades: “Sempre que venho ao Brasil, assisto à TV para ver como o país se representa. Pela TV brasileira, nunca seria possível imaginar que sua população é majoritariamente negra. (…) Não posso falar com autoridade no Brasil, mas às vezes não é preciso ser especialista para perceber que alguma coisa está errada se a cara pública deste país, majoritariamente negro, é branca”.
Com uma luta árdua e lenta, a promoção de oportunidades a todos cresce todos os dias. São eventos e momentos representativos que abrem as portas para um olhar crítico contra o racismo. Um exemplo é o Oscar 2016, que gerou discussão e oportunidades para difundir conceitos como o whitewashing quando não apresentou nenhum candidato negro em suas categorias principais.
Outras formas, talvez mais sutis, de apropriação cultural no cinema é a de atores interpretarem deficientes físicos e personagens de gênero não tradicional sem apresentar tais características pessoalmente. Nesses casos o processo se dá por haver possibilidade de honrar tais grupos com atores realmente pertencentes à sua história, mas que são negados a fim de promover os filmes com atores já conhecidos e famosos.